sexta-feira, 23 de junho de 2017

Há 50 anos era inaugurado o Estaleiro da Margueira

Cartão de Ingresso no Estaleiro no dia da inauguração
Há precisamente 50 anos era inaugurado com pompa e circunstancia o Estaleiro da Margueira, que projectaram o nome da Lisnave pelo Mundo. O projecto era ambicioso e numa escala nunca antes vista no nosso país neste sector. Usando as mais modernas técnicas e "know-how" de ponta, cedo a marca Lisnave começou a ecoar pelos quatro cantos do mundo naval. A inauguração deste Estaleiro foi um verdadeiro acontecimento na vida do país. Os convidados começaram a chegar ao local por volta das 14 horas estando presentes membros do Governo, representantes dos meios económicos nacionais, altos funcionários do Estado, delegados de numerosas empresas financeiras e industriais estrangeiras, enviados das principais companhias petrolíferas e de armação de navios, nomeadamente a Esso, Gulf, BP, Shell, Niarchos, Onassis e Norwegian Shipping, já para não falar nos membros da direcção, técnicos e empregados da empresa. Citando a Revista Industria Potuguesa "Ao todo, cerca de 7500 pessoas. Um caso único na vida das empresas económicas portuguesas" (ontem, como hoje!) À chegada do Presidente da Républica, a cerimónia inaugural principiou pela abertura das válvulas da doca 11 de 300.000 toneladas. Cheia a doca, o que levou 2 horas, o Presidente da Republica descerrou uma lápida com os seguintes dizeres: 

Momento da abertura das valvulas da doca 11
"Aos 23 de Junho de 1967, Sua Excelência o Senhor Almirante Américo Deus Rodrigues Thomaz, Presidente da República Portuguesa inaugurou este estaleiro naval, empreendimento no qual se congregaram homens e capitais portugueses, holandeses, e suecos e cuja colaboração e esforço se devem o projecto e construção deste estaleiro, a previsão do seu futuro desenvolvimento e formação do seu pessoal"

E por falar em previsão, é interessante verificar a constante evolução em termos de previsibilidade da sua docagem ao longo do projecto. Em 1961 considerava-se uma tonelagem de 65.000 ton. como bastante grande. Porém em curto espaço de tempo, novas metas surgiram para fazer face ao rápido crescimento da arqueação bruta dos navios. Assim em 1962 previam-se duas docas para navios com 100.000 ton, em 1964 duas docas para 150.000 ton., no ano seguinte aumentava-se uma das docas para poder receber navios na ordem das 200.000 ton. e por fim em 1966 o projecto final: uma doca para navios até 300.000 ton. e outra com capacidade até 100.000 ton.

Este foi um dos primeiros projectos industriais virados a 100% para o mercado internacional. O que significava que a empresa iria concorrer sob forte concorrência internacional. E como se sabe, apesar disso, tornou-se num emorme sucesso empresarial, tão grande que passados apenas 4 anos, foi necessário construir uma gigantesca doca para navios até 1 milhão de toneladas por forma a fazer face ao constante crescimento da querenagem dos navios, bem como ao próprio estaleiro adiantar-se face aos seus concorrentes mundiais. A sua tecnologia de ponta era motivo para visitas de todo o tipo de personalidades e técnicos estrangeiros, mesmo em termos de desgasificaçao e lavagem dos navios tanques. A sua localização geográfica em plena Rota do Petróleo, fez despoletar em poucos anos a planificação de um ambicioso projecto de dominar essa mesma Rota em varios pontos com a criação em meados/finais dos anos 70 dos Estaleiros de Reparação no Bahrein, em Jeddah, no Brasil (que não foi concretizado) e outro em Curaçau. Mas isso são outras histórias que ficarão para contar numa próxima ocasião. 

Refira-se ainda que no acto inaugural do Estaleiro, os Paquetes "India" e "Principe Perfeito" na Companhia Nacional de Navegação deram entreada nas docas 11 e 12.

À esquerda o Paquete Principe Perfeito, vendo-se a entrar a doca o Paquete India


Discursaram depois, o Sr. José Manuel de Mello, Gonçalo Correia de Oliveira (Ministro de Economia) e o Almirante Américo Thomaz. 

No final da cerimónia foi servido um jantar a bordo do "Principe Perfeito"

Como forma de perpetuar este acontecimento a empresa editou uma medalha da autoria do grande escultor Leopoldo de Almeida, existentes em módulos grande e em módulo pequeno



Também os C.T.T. se juntaram às homenagens editando uma série comemorativa de selos com o carimbo do primeiro dia.





Uma das peças mais interessantes que possuo é esta. Trata-se da brochura lançada pela Lisnave da inauguração do Estaleiro que foi oferecida ao então Presidente da Républica, Almirante Américo Thomaz. Encadernada em pele e debruada a ouro, na primeira página pode-se ver a dedicatória e a assinatura de José Manuel de Mello ao Chefe de Estado.




E para terminar este post, deixo-vos parte dos ecos deste acontecimento nos meio de comunicação social.

Diário de Noticias de 24 de Junho de 1967


Revista Flama - 30 de Junho de 1967

Industria Portuguesa Nº 473. Julho de 1967

Vida Mundial Nº 1463, 23 de Junho de 1967

Jornal de Almada - 24 de Junho de 1967



Revista Lisnave Nº 19, Julho de 1967 (capa e noticia da pág. 4)


Defesa Nacional Nº 401-402, Setembro-Outubro de 1967


Shipping World & Shipbuilder, Agosto de 1967

Quero deixar aqui o meu agradecimento público ao meu amigo Carlos Caria que teve a gentileza de me oferecer o Cartão de Ingresso no Estaleiro no dia da inauguração, que deve ser um documento que certamente poucos devem ter sobrevivido á voragem dos tempos. 

2 comentários:

João Celorico disse...

Amigo Ricardo,
só tenho a referir neste texto que por 3 vezes, no Presidente da República, fugiu às regras da ortografia.
Como informação suplementar, dizer que a localização do Estaleiro esteve prevista para o Samouco.
Outra informação, penso que sobre a Setenave, ao tempo dizia-se que Miguel Quina (Banco Borges & Irmão), sabedor desse projecto, estaria a apresentar o projecto dum estaleiro perto da Trafaria. O Governo teria que decidir qual aceitava. Criou-se um impasse e entretanto, o Governo autorizou a Miguel Quina um projecto para outra coisa qualquer, que devia ser o que ele queria e então a Setenave lá avançou.
Meandros dos negócios.

Abraço,

João Celorico

Carlos Caria disse...

Como sempre mais um excelente trabalho histórico.
Abraço e disponha sempre.
Carlos Caria